domingo, 9 de dezembro de 2012

A Modernidade de Eça de Queiroz


Eça de Queiroz, um dos meus escritores favoritos e um dos críticos mais sagazes de sempre, e simultaneamente um dos seus maiores pensadores, na medida em que retratou como ninguém a sociedade e a psicologia dos portugueses, num estilo irónico e humorístico único, presente nos seus romances, participações jornalísticas e correspondência.

Apresento agora o excerto de um artigo de Eça escrito em As Farpas, que tem como título “Habilitações necessárias para ser ministro…” e que se não soubermos em que época foi escrito, podemos muito bem associá-lo aos dias de hoje, pois a sociedade continua igual à sociedade do século XIX: “Há muitos anos que a política em Portugal apresenta este singular estado: doze ou quinze homens, sempre os mesmos, alternadamente possuem o poder, perdem o poder, reconquistam o poder, trocam o poder… O poder não sai de uns certos grupos como uma péla que quatro crianças, aos quatros cantos de uma sala, atiram umas às outras, pelo ar, num rumor de risos. Quatro ou cinco daqueles homens estão no poder, esses homens são segundo a opinião e os dizeres de todos os outros que lá não estão – os corruptos, os esbanjadores da fazenda, a ruína do País. Os outros, os que não estão no poder, são, segundo sua própria opinião e os seus jornais – os verdadeiros liberais, os salvadores da causa pública, os amigos do povo, e os interesses do País. Mas, coisa notável! – os cinco que estão no poder fazem tudo o que podem para continuar a ser os esbanjadores da fazenda e ruína do País, durante o maior tempo possível! E os que não estão no poder movem-se, conspiram, cansam-se, para deixar de ser o mais depressa que puderem – os verdadeiros liberais, e os interesses do País.”

Eça de Queiroz, de facto, soube rapidamente tornar-se um homem universal e mais semelhante a um homem do século XXI que do século XIX, devido à sua extraordinária capacidade de visão e de crítica não só do universo nacional como também de todo o universo.

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